Deepavali

Hoje é ano novo indiano: Divali. Ou Diwali. Ou Deepavali.

Assim como a Índia, por si só, já apresenta a maior diversidade religiosa por metro quadrado, essa data assume diversos significados para esse povo: tâmils, hindus, sikhs, budistas... ao fim, todos tratam da mesma coisa: iluminação. É o Festival das Luzes, indicando o triunfo do bem contra o mal e a iluminação espiritual do indíviduo.

Os indianos do norte chamam de Diwali; os do sul, de Deepavali. Na Malásia, usa-se esse último nome. É feriado nacional e uma data móvel baseada no calendário lunar, assim como o Hari Raya - caindo sempre entre o fim de outubro e os 15 primeiros dias de novembro. De acordo com a sua crença, o dia pode marcar o retorno de um rei, a morte de um demônio, o fim de uma guerra ou um casamento entre deuses. Para comemorar, os povos acendem cordas de algodão mergulhadas em óleo, sendo esta a origem do nome do festival (dipa = lamparina / avali = fila).

Tapete de serragem e velas na entrada do escritório. Os malasianos homenageiam todos os credos, e esses tapetes são encontrados pela cidade toda. Ao centro, imagem de Ganesha, deus hindu da sucesso, removedor dos obstáculos.

 Como trata-se de evolução espiritual, os indianos preparam suas moradas para receber as bençãos: compram roupas novas e fazem faxina na casa e no escritório - alguns até os reformam ou renovam a pintura. É comum também que se inicie um novo ano fiscal nesse dia, e os indianos do Norte geralmente abrem novos livros de caixa em seus comércios.

Uma outra tradição é a troca de doces e salgadinhos típicos do festival, em sinal de retribuição pela amizade e pelas conquistas do último ano. Aqui na Malásia, isso adquire uma aura toda especial, porque mexe com algo que eles adoram: comida! Acontecem mais open houses e os indian malaysians recebem qualquer pessoa, independente de raça ou posição política.

Em Kuala Lumpur, o bairro indiano é Brickfields, perto da estação central. Em tempos ditos normais, já é uma área bem colorida e barulhenta. Durante as festas, multiplicam-se as músicas, as ofertas e as luzes. A preparação começa umas três semanas antes (nesse ponto, os ocidentais são mais capitalistas: em minha cidade, já ocorre liquidação de Natal).


Uma das avenidas de Brickfields, no fim da tarde de ontem. Vendedores gritando ofertas e jingle bells instrumental tocando ao fundo...

Junto ao festival, não poderiam faltar as feirinhas típicas da temporada - aqui chamadas de melas, onde você pode encontrar tudo. Ao se aproximar de uma banquinha, lembre-se que os indianos não são tão bons negociadores quanto os chineses: as mercadorias valem a cara do freguês. Se você não conseguir convencê-los a baixar o preço, sempre existe outro vendedor mais amigável, é só procurar. Ah, e não estranhe se você perguntar algo e eles balançarem a cabeça de um lado para o outro. Isso não quer dizer 'não'. Eles apenas estão concordando com o que você diz.

Um corredor de uma das melas da cidade. Tinha ar condicionado, claro.

As mulheres, além de estarem vestidas com os melhores sáris, também enfeitam-se com jóias, maquiagem e henna. As tendas de mehndi são que nem praga! Eu aproveitei e fiz um desenho, custou 5 ringgit (quase uns 3 reais).

O processo...
 
Tchaanz!! : ) A henna preta dura até 2 semanas, mas você também pode fazer com a vermelha, que dura 5 dias.

Os fogos de artifício são um capítulo à parte na comemoração do Deepavali. Eles adoram. Mesmo. Tanto que soltam foguetes no meio das melas. Jogam bombinhas no seu pé, quando você passa. Estouram morteiros das sacadas dos prédios, mirando o chão. À meia-noite, Kuala Lumpur inteira estava às claras, com tantos fogos. Em Brickfields, a polícia teve de intervir, pois os transeuntes estavam quase em chamas (não ria, é sério!).

No dia propriamente dito, os indianos levantam às quatro da manhã, durante o Brahmamuhurta, e tomam banho de óleo, considerado purificador. Depois, fazem suas orações em família e vão ao templo, para agradecer aos deuses. Na Índia, eles se cumprimentam perguntando 'Você já tomou banho no Ganges?', comparando o banho de Deepavali ao rio sagrado. Aborrecimentos são perdoados e todos somente desejam sucesso e prosperidade uns aos outros. A união familiar é a mais celebrada. No dia seguinte à comemoração com os entes, saem para visitar os amigos e trocar doces.

Todo o significado que as luzes trazem, além da preparação espiritual, é muito bonita. Paradoxalmente, o bairro indiano pode ser considerado um gueto e eles são a minoria da população malasiana. Já ouvi muitos rótulos sobre eles e alguns confirmaram-se verdade. Talvez seja assim que eles encontraram meios de sobreviver sem serem atacados. As lamparinas de Deepavali deveriam iluminar sem distinção, trazendo paz e crescimento espiritual a todos, seres únicos, mas iguais na origem e no destino final.

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: : Em KL, 18h11.
: : Ouvindo: U2.