Buzinas, uma aparente desorganização e oásis de tranquilidade: assim é Hanói!

Pois é, José. A festa acabou. O contrato venceu. Muito se fez e muito mais poderia ter sido feito. Mas sem lamentações, porque dei o meu melhor e estou tranquila em relação às minhas ações. Contudo, antes de a quadrilha acabar, ainda restava mais uma viagem a trabalho: Vietnã. Durante o último ano cuidei de todos os procedimentos para abertura do escritório naquele país - nada mais justo que fosse lá e acertasse algumas parcerias in loco. Dessa vez, estendi a viagem e fiquei fora por uma semana! Parece muito, mas com tudo que Hanói tem a oferecer, ainda há motivos para voltar.
 
Campos de arroz ao redor de Hanói, vistos do avião. O país é o 2º produtor mundial do cereal.

Desembarcar em um país de colonização latina sempre provoca em mim uma sensação de pertencimento. É estranho, mas parece que já sei o que vou encontrar por lá. Hanói nos esperava com seus inúmeros parques, lagos, a arquitetura francesa e um ritmo de vida peculiar. Logo descobrimos que o horário de almoço é sagrado - duas horas, para dar tempo de sentar-se à mesa com os amigos ou a família. Depois de degustar a refeição, a sesta é obrigatória: qualquer banco ou sombra é o suficiente para a soneca. O clima da capital também ajuda: norte, centro e sul do Vietnã possuem estações distintas devido à geografia do país. Em Hanói, o clima é tropical, mas seco (o sul se parece mais com o clima da Malásia e também sofre com monções). Por conta das áreas verdes, o calor não aparenta ser tão horrível e sempre há uma brisa fresquinha soprando. Nas montanhas próximas à fronteira com a China, chega a nevar durante o inverno.

Prédios ao redor do Lago Hoam Kiem, no Old Quarter. Durante a ocupação francesa, o imposto sobre propriedade era baseado na largura da fachada - daí, surgiu uma solução única para espaços limitados e impostos altos: construções finas e compridas. Prédios mais recentes continuam seguindo o padrão.

Hanói é dividida em duas áreas, basicamente: Old Quarter, onde a maioria das atrações turísticas se concentram, e o French Quarter, área onde os colonizadores se estabeleciam e que hoje concentra a administração pública, embaixadas e lojas de grife. Sim! De grife! Mont Blanc, BMW, Tissot, Louis Vitton... como a China, o socialismo vietnamita é aplicado à conveniência dos governantes. Propagandas políticas e a figura de Ho Chi Minh são onipresentes, enquanto a elite do país não deixa lojas como a Gucci ficarem vazias.

Locais ao redor do Lago Hoam Kiem, no Old Quarter.

Propaganda socialista ao redor do Lago. 
Fato rápido: até o século XVI, os vietnamitas usavam caracteres chineses para escrever. Aí veio Alexandre de Rhodes, decodificou os traços e desde então, eles usam o alfabeto latino com a marcação dos tons.

Eu e Huw, meu colega de trabalho, nos hospedamos no Old Quarter, uma posição central para as reuniões de negócios e para explorar a ciadade a pé - Hanói é plana, o que facilita muito! O Old Quarter também é ótimo para que vivencie-se uma imersão cultural. O nome de cada rua, em vietnamita, refere-se ao tipo de comércio lá feito: daí tem-se a Rua das Cordas, Rua das Ervas, Rua dos Calçados (sem numeração, escolhe-se por P, M ou G), Rua da Funilaria... e obviamente, Rua das Camisetas! Ir ao Vietnã e não comprar uma camiseta "Good morning, Vietnam" é não despertar o turista coxinha que existe em você! rs Eu comprei umas oito, de diferentes estampas - 30 mil dongs cada, quase 1,5 dólar. Depois fiquei pensando em como essas pessoas sobrevivem com uma renda dessas...

Hoam Kiem e sua ilhazinha são envoltos em mistérios e aparecem nas lendas de fundação de Hanói. O Old Quarter cresceu ao redor dele.

Em 10/10/2010, Hanói faz mil anos. =)

Floreiras do lago

No meio das barraquinhas e diante das lojas estreitas, há o motorista de ciclo, bicicletas, a típica vietnamita com chapéu cônico e suas cestas - e muitas, muitas motos. Buzinas, idem. Houve dias em que voltamos para o hotel com dor de cabeça! No começo, tudo parece muito desorganizado - mas após uns dois dias, você aprende a etiqueta do trânsito. Acidentes ocorrem, claro, mas o tráfego de carros e pedestres flui. Você aprende a ficar alerta até em restaurantes. Seja no meio dos banquinhos na calçada ou nas mesas de parte com ar condicionado, os locais vão guardar a moto dentro do estabelecimento! É quase um drive-thru!

 
A típica vietnamita

 
Uma parte das motos estacionadas em frente ao nosso hotel

Parte do trânsito

Falando em comida, eu poderia dedicar um capítulo inteiro à gastronomia da cidade. Que falta fazem frutas frescas e uma boa carne! Ao contrário da Malásia, onde tudo tem o mesmo gosto, no Vietnã a banana tem gosto de banana, a carne de vaca tem gosto de carne de vaca... os vegetais e folha são sempre fresquinhos e abundantes. Como a maioria da população é budista e não há restrições alimentares, também tem porco!! Bacon, salaminho, presunto... e para completar: padarias francesas! Ah! Baguetes, mistos, bagels, queijo... o paraíso! E pra melhorar o astral, barato! Para vocês que me lêem, pode não parecer grande coisa, mas após um ano comendo noodles e frituras com óleo de palma, qualquer um pede arrego!

Spring rolls frescos! Camarão e carne de porco!

 
 Baguete de bacon com abacate

 O cardápio-jornal da cafeteria

Passando o café. Por lá, a bebida também é diferente e bem mais próxima do que temos no Brasil. 

Deu dó de comer

Os vietnamitas comem de tudo, mesmo: insetos, porquinhos-da-índia, pombos, cachorros... culpa das guerras! Me recusei a procurar tais lugares e tirar essas fotos (e eles estão em qualquer esquina, com um banquinho e uma grelha). A exceção foi o último restaurante no qual jantamos: decoração refinada e uns dois casais de expatriados, resolvemos entrar. Pelo cardápio, descobrimos que serviam rolinhos-primavera de gafanhoto, entre outros pratos exóticos. Pedimos carne de búfalo. Dica: se você algum dia quiser experimentar insetos no espetinho, quebre as perninhas antes de morder o corpo - elas entalam na garganta como espinha de peixe.

Os quatro primeiros dias no Vietnã foram bem espremidos entre reuniões e passeios. Algumas chuvas atrapalharam a andança e não pudemos tirar fotos com tanques de guerra. Bem, tudo é motivo para voltar! Um pouco do feeling da cidade está aqui.

 Mausoléu de Ho Chi Minh

Teatro de fantoches na água, contando a história do Vietnã

Templo de Literatura, a Universidade mais antiga da Ásia. Mais de trinta tartarugas de pedra (animal sagrado para os vietnamitas) carregam as inscrições dos alunos que já passaram por lá, desde o ano 1010.

Os alunos, para sempre lembrados.

E já que eu estava num país socialista... um parque só pra ele!

Catedral de São José, arquitetura francesa.

O exterior mal-cuidado guarda relíquias como essas.


Emblemático, não?

Assim como os cambojanos, os vietnamitas estão sempre sorrindo. O budismo, somado à política socialista, fizeram essa sociedade um pouco mais igualitária. Aqui no Sudeste Asiático, foi o único país em que vi homens e mulheres desempenhando as mesmas funções lado a lado, incluindo trabalhos braçais. Pelo pouco tempo que lá fiquei, também percebi que elas são tratadas com mais respeito que em países vizinhos - e não me senti ameaçada por olhares ou ações machistas.

O acesso à cultura e a esportes também é latente: os discursos de Ho Chi Minh sobre educação física e mental impregnaram-se no cotidiano do país. Os parques, desde cedinho, estão sempre cheios de pessoas cuidando de seu bem-estar (vimos ioga, taichi e até line dancing); os museus também são venerados pelos locais, que cuidam de sua história e a exibem com orgulhos aos estrangeiros. 

Os dias em Hanói foram intensos. A aparente desorganização é marca registrada da cidade. Porém, ao escolhermos um banquinho em uma praça, visitarmos um templo, ou sentarmos para comer, percebemos que aquele lugar se torna um oásis de tranquilidade. A vida passa ao seu redor sem lhe incomodar, seguindo o seu próprio ritmo, encaixando-se perfeitamente ao espírito da capital. As buzinas ecoam longe e parecem estar em um mundo paralelo.

Depois do trabalho, o merecido descanso! De Hanói, tivemos alguns dias de folga e fomos um pouco para o norte do país, descobrir Halong Bay - mas esse tópico fica para o próximo post. Se quiser ver mais fotos e alguns vídeos da cidade, visite o Flickr, há várias surpresinhas por lá.


:: Em KL, 23h02.
:: Ouvindo: Lit.